quinta-feira, 15 de setembro de 2016

QUINTA DE POESIA







COM VINHO

Passou os olhos, deu-me um charme extra
que eu considerei como meu próprio.
Felizmente engoli uma estrela.

Deixei-me ser inventada,
modelada na minha própria imagem
em seus olhos. Eu danço, danço, danço
ao frêmito de inesperadas asas.

A cadeira é uma cadeira, o vinho é vinho,
num cálice que é o cálice
pousado ali por pousar ali.
Imaginária sou apenas eu,
fraude para além da credibilidade,
tão fantasiosa que dói.

E eu lhe conto fábulas sobre
formigas que morrem de amor sob
uma constelação de dentes-de-leão.
Juro que uma rosa branca cantará
se a espargires com vinho.

Eu rio e inclino minha cabeça
cuidadosamente, como a conferir
o quanto a invenção funciona.
Eu danço, danço dentro de minha aturdida
pele, em seus braços que me criam.

Eva da costela, Vênus da espuma,
Minerva da fronte de Júpiter-
qualquer das três mais real que eu.

Quando ele não está olhando,
tento capturar meu reflexo
na parede. E eu vejo o prego
onde uma foto costumava estar.



Wyslawa Szymborska

Tradução de D. O. d'Avila

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