Estranha nebulosa
Numa segunda qualquer de um novo dia
ela esqueceu a dor azul da violetas.
Olhou com atenção todos os móveis
( são fugidios os móveis cotidianos )
enfiou numa gaveta verso e prosa
fez o sinal da cruz pela metade
pendurou o rosário sem a reza
e murmurando palavras divertidas
bem devagar foi deslocando o mundo.
Sufocava no quarto conhecido.
Calçando o tanto faz dos sem sapatos
caravela, singrou o corredor.
Na luz que entrava, equilibrou a pressa.
Era longa a travessia e perigosa.
Num exaspero bom sem ser virtuoso
com mãos de parto rompeu quatro portas.
Desceu longas escadas, uma a uma.
Deixou rastro de brilho nos ladrilhos.
Abriu-se toda ao chegar à rua.
Ganiu de amor, estranha, nebulosa.
Via láctea sentada na pracinha.
Ana Mariano
Imagem: Tearing the pages
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